quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Aspie FAQ's


Informações rápidas para aqueles novos ao mundo “Aspie”[1]


Aspies são:

· Pensadores visuais
· Pensadores literais
· Orientados pela rotina
· Pensadores inflexíveis
· Fracos em socialização
· Confiável na maioria das vezes
· Orientados por regras
· Obsessivos por seus temas/assuntos/interesses favoritos
· Principalmente incapazes de entender o ponto de vista de outras pessoas

Aspies tendem a:

· Ter baixa auto-estima
· Aproveitar melhor o tempo gasto com pessoas mais novas ou mais velhas do que com pessoas da mesma idade
· Interromper as pessoas quando ainda estão no meio da sentença
· Ter dificuldade em dominar o contato visual
· Ter sonhos noturnos muito vívidos
· Ter habilidades de funções executivas fracas
· Ter QIs médios ou acima da média
· Achar difícil fazer mais de uma tarefa ao mesmo tempo
· Ser descoordenado.
· Ter alta tolerância à dor
· Ser muito ético e moral
· Achar a introspecção muito difícil
· Ser muito vulnerável/suscetível ao estresse
· Falar em voz alta sobre pensamentos íntimos
· Achar difícil entender e discutir suas emoções
· Ter dificuldades com relações interpessoais
· Ter grande habilidade verbal
· Copiar comportamentos, falas, sotaque e aparência de outras pessoas

Aspies frequentemente tem outros problemas, como:

· Transtorno de Processamento Auditivo Central
· Hiperlexia
· Transtorno de Déficit de Atenção ou Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade
· Problemas com Integração sensorial
· Transtornos de aprendizado não verbal
· Transtorno de Linguagem Semântico-Pragmático
· Depressão
· Grandes ou pequenos problemas com movimentos

Declaração de compromissos para Aspies

· Eu não sou defeituoso/deficiente. Sou diferente.
· Não sacrificarei minha dignidade pessoal para ser aceito pelos colegas.
· Sou uma pessoa boa e interessante.
· Sou capaz de conviver em sociedade.
· Pedirei ajuda quando precisar.
· Mereço o respeito e a aceitação por parte das outras pessoas
· Encontrarei uma carreira profissional bem adequada às minhas habilidades e interesses.
· Serei paciente com quem precisa de tempo para me entender.
· Nunca desistirei de mim mesmo.
· Eu me aceitarei como sou.


Declaração de Compromissos para pais de Aspies

Vou me esforçar para:


· Ver o mundo através dos olhos do “meu” aspie.
· Procurar ajuda profissional assim que perceber que as coisas tomam rumos que vão além da minha capacidade de lidar ou entender.
· Tornar-me o mais forte defensor do meu filho.
· Não ter vergonha do comportamento do meu filho, sem levar em consideração conselhos inadequados.
· Rir quando eu puder rir.
· Entregar-me à tristeza somente quando precisar.
· Montar uma bela equipe de apoio.
· Permanecer otimista em relação ao futuro do meu filho.
· Olhar para todos os lados como pai, relembrando-me sempre que todos os meus filhos precisam de mim.
· Encontrar tempo para minhas outras pessoas queridas.
· Encontrar algum tempo para mim mesmo.
· Encorajar os pontos fortes do meu filho muito mais frequentemente do que protegê-lo/limita-lo por seus pontos fracos.
· Aproveitar o que for bom e agüentar a onda quando não for tão bom.
· Pôr um final à culpa e acusação.
· Entender que há um mundo além da Síndrome de Asperger.

Compreendendo as “conversas de salão” /conversas informais/conversas fiadas

Nós Aspies somos conhecidos por nossas dificuldades com conversas informais. Falando objetivamente, parece-me que os aspies tendem a temperar sua conversa com muito mais verbalizações flagrantemente inadequadas que seus colegas neurotípicos. Minha própria auto-análise apontou sete problemas de comunicação que acredito dividir com meus amigos aspies. São eles: brusquidão, intromissão, egocentrismo, inadequação, pedantismo, falta de coerência e insensibilidade. Pode haver mais ou haver menos, mas eu poderia apostar que a maioria dos nossos confusos comentários tem suas raízes em um desses problemas.


Procurando encontrar um caminho para fazer a conversa de um Aspie mais adequada a uma conversa neurotípica, pensei que poderia ser útil mostrar exemplos de trocas verbais comuns da maneira que um aspie provavelmente as fariam e como poderiam ser se isentas/livres de imperfeições/falhas que pudessem conter. Em outras palavras: uma apresentação “antes e depois”. Para simplificar e ilustrar, cada uma das trocas imperfeitas conterá uma das sete falhas mencionadas acima.

Para tornar esse apêndice um exercício proveitoso, sugiro que um amigo de confiança ou confidente do aspie acompanhe as trocas dadas, parando para discutir os prós e contras de cada uma no detalhamento que for necessário para conseguir uma boa compreensão. Por exemplo, depois de ler os comentários “Esta festa está chata. Vou embora agora”, alguém pode mostrar que apesar ter sido honesto/sincero e objetivo, também pode ser grosseiro e insensível. Tudo isso esperando que uma vez que o/a aspie estude objetivamente o discurso aqui apresentado, ele/ela possa aplicar novas regras e talvez regras semelhantes à sua própria fala. Uma observação: antes que se começar esse tipo de “estudo”, é muito importante que a pessoa aspie entenda que esta proposta não inclui nenhuma crítica pessoal. Eu conversaria muito com o aspie até que ele/a entenda a idéia de ajudá-lo a fazer sentido para os neurotípicos de maneira que possam entendê-lo. Meu marido e eu tentamos muitas vezes dizer a nossa filha que não é tanto o que ela fala, mas principalmente como ela fala – que faz com que sua conversa com amigos e professores “vingue/prospere” ou “naufrague”. Então, quando ela diz: “Mas eu não queria magoar ninguém” podemos assegurar-lhe que temos certeza disso, mas independente da sua intenção, as palavras podem magoar e por causa disso, devem ser cuidadosamente escolhidas. Quando conseguirmos ensinar-lhe que o que ela pretende dizer não é necessariamente o que um neurotípico ouve, poderá encontrar um longo caminho em direção a um bom repertório de conversas. Mais uma observação: a maioria dos exemplos de “antes” foram ditos por mim... antes que eu inventasse esse pequeno guia para conversas.

Conversa informal 1: Começando e terminando uma conversa

Eu nunca tenho muita certeza sobre como iniciar ou terminar uma conversa. Pareço mais inclinada a esquecer as introduções. Tenho que me relembrar que há certas regras as quais a sociedade estabeleceu referentes a como devemos entrar e sair de uma conversa. Como muitos aspies, eu tendo a verbalizar tudo o que vem à minha cabeça, sem me independente do assunto, sem me importar com quem estou, ou se conheço ou não a pessoa. Também conheço muitos aspies que largam um conversa no meio da oração. Em muitas ocasiões, presenciei aspies virando-se e indo embora antes que a pessoa com a qual está falando tenha terminado o que estava tentando dizer, ou se afastar mesmo que eles mesmos ainda estejam falando/conversando. Isso me faz pensar que os aspies esquecem que conversas têm começos, meios e fins – nesta ordem. Quando converso com outras pessoas, eu sempre monto um diagrama mental da conversa construído a partir de introduções e finalizações que memorizei. Normalmente parto do princípio que o meio “toma conta dele mesmo” se eu me lembrar de todas as outras pequenas regras apresentadas nesse Apêndice.

Antes
Estou tão gorda. Como tanto quanto meu marido.

Depois
Não é difícil fazer compras no supermercado sem comprar porcarias? Mesmo achando que estou acima do peso, compro comidas que engordam muito. E ainda acabo comendo mais desse tipo de comida que o meu marido.

Antes
Você me conhece?
Depois
Já nos encontramos antes?

Antes
Não te conheço. Quem é você?
Depois
Oi. Meu nome é... Eu nunca tinha visto você por aqui. Você chegou faz pouco tempo?


Antes
Não quero mais conversar com você. Tchau.
Depois
Foi interessante/bacana/legal conversar com você. Até mais, então.

Antes
Esta festa tá chata. Vou embora daqui.
Depois
Nossa! Está tarde! Melhor eu ir andando.

Conversa informal 2: Usando transições apropriadas

Pode ser bem difícil, mas a idéia principal é construir pontes entre os assuntos de maneira que os ouvintes/interlocutores não precisem ficar “caçando” as idéias imaginando o que virá a seguir e o que aconteceu com o pensado anteriormente. Toda vez que converso, tento me lembrar de evitar que a minha cabeça fique pulando pra lá e pra cá muitas vezes. Para me manter no assunto/nos trilhos, também tento incorporar perguntas nas minhas falas, de maneira que as outras pessoas com as quais converso possam participar e ter sua vez de falar. Se não, como muitos outros aspies, vejo que tendo a monologar e dirigir a conversa de forma desconexa, com muitos pedaços soltos. Meu último truque para evitar isso é tentar adicionar mais informações/dados/explicações do que eu acharia necessário, mesmo correndo o risco de parecer muito tagarela. Tudo isso porque percebi que as outras pessoas não conseguem ler minha mente. O interlocutor precisa de um pouco de “entretantos/recheios” para entender de onde estou vindo.

Antes
Tenho um cachorro enorme. É um Newfoundland. É uma raça gigante. Não entende porque não posso levar meu cachorro a lugares públicos. As pessoas podem ser tão grossas nesses lugares. Os estacionamentos são os piores lugares. Odeio quando as vagas para deficientes são ocupadas por pessoas que não precisam. Não me considero deficiente. Só diferente, capacitada de maneira diferente. Quando olho pro céu fico imaginando como aqueles pássaros são capazes de voar. Não é um milagre?
Depois
Tenho um cachorro enorme. É um Newfoundland. É uma raça gigante. Não entende porque não posso levar meu cachorro a lugares públicos. Falando de lugares públicos, você não acha que há pessoas muito grossas nesses lugares? (neste ponto o assunto mudou. É um bom momento para deixar que a outra pessoa fale). (Digamos que a outra pessoa diga que sim, as pessoas podem ser rudes). Nos estacionamentos, odeio quando as vagas para deficientes são ocupadas por pessoas que não precisam. Isso me lembra que conheço muitas pessoas que consideram a Síndrome de Asperger uma deficiência. Eu não penso assim. Não me considero deficiente. Só diferente, capacitada de maneira diferente. Pensando em capacidades diferentes, quando olho pro céu fico imaginando o milagre que é o vôo dos pássaros. Você concorda? (O tópico mudou de novo e de novo aí está uma boa oportunidade para deixar outra pessoa falar)

Antes
Não vá sair sem gorro e chapéu. Está muito frio e você pode se congelar. Preciso ir ao supermercado comprar leite. Onde pus meu café? Preciso arrumar a casa. Ta ficando muito bagunçada.
Depois
Não vá sair sem gorro e chapéu. Está muito frio e você pode se congelar. Eu também preciso sair. Preciso comprar leite. Queria um pouco de leite no meu café. Onde pus meu café? Ta difícil achar as coisas nessa casa. Ta muito bagunçada.

Conversa informal/conversa fiada 3: expressando opiniões gerais

Para mim foi muito difícil acreditar, mas finalmente aprendi a perceber que a maioria das pessoas não está interessada em saber todas as minhas opiniões, principalmente aquelas com as quais só converso fiado/tenho pequenas conversas. Esta é uma das tarefas comunicativas mais difíceis para mim. Acho muito asfixiante conversar sem dar minhas opiniões. Para contornar essa dificuldade, tentei encontrar maneiras de opinar gentilmente e sem exagerar na ênfase. Tento não ser rude e amenizar/suavizar minhas opiniões com frases sutis/cuidadosas como “Eu acredito que...” ou “Posso estar errada, mas...” ou “Talvez...” ou “Não tenho certeza, mas....” Também me apoio no que chamo de “perguntas responsáveis ou para prestar contas” em vez de afirmações declarativas quando quero dar a minha opinião abertamente. Esses tipos de perguntas encorajam as pessoas a analisar o seu próprio comportamento de maneira que eu possa significar/fazer o papel de um observador objetivo e não um advogado de acusação. Esses métodos não são infalíveis. Quando que fui rude demais ou muito “opiniosa”, eu sempre peço desculpas e explico que não tinha intenção de agir como uma sabe-tudo mal educada. Em outras palavras, eu tento não parecer como uma pessoa muito cheia de opiniões incapaz de ouvir os outros ou tão egocêntrica que seja incapaz de se preocupar com o que os outros teriam a dizer. Sendo sincera, eu realmente acho impossível guardar minhas opiniões para mim mesmo. Acho que não faz nenhum sentido falar, se eu não puder falar tudo o que penso. Qualquer outro tipo de conversa parece sem sentido para mim. Mesmo assim, aprendi a controlar meu desejo de falar tudo... pelo menos um pouquinho.

Antes
Você não deveria carregar uma mala tão grande no avião. Você precisa voltar para o check-in e enviar essa mala, que é obviamente muito grande para esse compartimento de bagagem. Vá fazer isso agora!
Depois
Nossa. Essa mala parece muito grande. Tem certeza que ela vai caber no compartimento de bagagem? Talvez você não devesse tê-la trazido a bordo.

Antes
De jeito nenhum você vai me servir esse sanduíche depois de pegar o dinheiro. Você precisa lavar suas mãos primeiro. Nem quero pensar nos micróbios/germes que você tem nas mãos. Por favor, jogue o sanduíche fora e faça outro.
Depois
Desculpe-me, mas não vi você lavar as mãos antes de fazer meu sanduíche. Notei que você estava mexendo em dinheiro agora mesmo. Poderia lavar as mãos e fazer um outro sanduíche? Tenho muito medo de germes. Obrigada!

Antes
Estou tentando conversar. Por que fica me interrompendo? Você não vê que minha boca está se mexendo? Quando eu acabar, você pode dizer o que precisa. Enquanto isso, fique de boca fechada.
Depois
Parece que nós dois estamos falando ao mesmo tempo. Vamos nos alternar. Se não se importar, quero falar primeiro para não esquecer o que queria dizer. Quando eu terminar, perguntarei sobre o que queria me dizer. Tudo bem pra você?

Conversa fiada 4: Adequando os diálogos à situação

Eu sei muito bem quanta energia se gasta em manter a conversa no rumo aceitável pelos neurotípicos. Algumas vezes me esforço tanto que fico exausta. Ainda bem que tenho amigos e família que aceitam meu “papo” aspie como ele é, totalmente sem mudanças ou amenizado. Com essas pessoas posso ser eu mesma, com afirmações esquisitas, emoções equivocadas e rudeza e tudo mais. Para citar meu marido, que recebe mais do meu verdadeiro eu que qualquer outra pessoa: “Se eu não gostasse desse aspecto seu, não estaria casado com você.” Pena que ele não represente os sentimentos de todos que ouvem a mina voz. O que sei agora é isso: a audiência é tão importante quanto a mensagem a ser dita, talvez até mais. Quando um aspie se prepara para falar, precisa compreender que a pessoa com quem conversa fará tantas? De maneira geral, penso haver três tipos principais de audiências a serem consideradas para adequarmos nosso discurso à situação e nos mantermos fora de encrenca. O grupo um incluiria pessoas com autoridade, como patrões, professores, policiais, juízes e médicos. O grupo dois abrangeria pessoas que convivemos durante o trabalho ou nas atividades cotidianas gerais, como colegas de trabalho, vizinhos, vendedores de lojas e estranhos que podemos encontrar em filas ou andando no parque. O grupo três envolve as pessoas mais próximas, amigos pessoais e membros da família.

Antes
Você está louco?Não fui eu joguei aquela lata de lixo na rua. Eu nunca desrespeito as leis e certamente nunca poluiria o meio-ambiente. Agora me deixa em paz.
Depois
(Grupo um) Eu não quero ser impertinente, mas posso assegurar-lhe que não joguei lixo na rua. Eu nunca poluiria. Vou recolher o lixo porque é a coisa certa a fazer; e depois, eu gostaria de poder voltar ao meu trabalho se tudo estiver bem.
(Grupo dois) Pode parecer que fui o/a responsável por sujar nossa rua, mas devo afirmar-lhe que eu nunca poluiria o meio-ambiente. Vou recolhê-lo porque não suportaria todo esse lixo por aqui.
(Grupo três) Vocês estão loucos? Vocês realmente acham que eu poluiria? Vocês sabem como o meio-ambiente é importante para mim. Agora me ajudem a recolher esse lixo, por favor.

Antes
Eu prestaria muito mais atenção ao meu trabalho se não tivesse que me preocupar com as roupas que devo usar para trabalhar. Gosto de usar minhas calças folgadas e moletom e não suportaria usar gravata ou terno. Como posso fazer um trabalho decente com um colarinho me apertando e um casaco me prendendo os movimentos?
Depois
(Grupo um) Andei lendo alguns estudos sugerindo que os empregados/funcionários rendem melhor no trabalho se puderem ter pelo menos um dia por semana em que possam usar roupa esporte. Você acha que nossa empresa poderia ser cogitar a possibilidade de implantar um programa desse tipo?
(Grupo dois) Eu certamente curtiria mais o trabalho se pudesse trabalhar com roupas esportes. É muito mais fácil me concentrar quando me sinto à vontade. Não seria legal se todas as empresas tivessem uma “Sexta Casual”(Casual Friday)?
(Grupo três) Gostaria que pudesse trabalhar usando minhas roupas preferidas. Se ficasse mais à vontade, prestaria mais atenção às minhas tarefas e tenho certeza que trabalharia muito mais sem um colarinho me apertando e um terno me prendendo os movimentos!

[1] Trechos traduzidos do livro Asperger Syndrome in the family: Redefining normal, de Liane Holliday Willey - Jessica Kingsley Publishers, 2002 (2nd edition), p. 162-172. Tradução por Inês de Souza Dias.

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